Tudo começou numa corrida de cavalos. O cavalo do Juiz Ordinário da Vila Nova Del Rei, depois Campo Grande (Guaraciaba do Norte), na Serra da Ibiapaba, ganhou o páreo contra o cavalo do poderoso da região, Cel. Manuel Martins Chaves. Quis este, logo comprar o animal vencedor, mas o dono recusou-se a vendê-lo. Discutiram, exaltaram-se os ânimos, e os dois sobrinhos do coronel mataram o pobre animal, não poderiam permitir que o tio, homem influente da célebre família Feitosa, fosse contrariado.
Manuel Martins Chaves fizera de sua prepotente vontade, a lei daqueles sertões, e para exercê-la, não hesitava em cometer qualquer ato de violência e arbitrariedade. Sob seu comando, bandos viviam a depredar e perseguir a população. Era um déspota, chefe de cangaceiros.
O coronel não se entendia com o juiz, pois este foi eleito contra sua vontade e ainda fazia favores ao governador Claudio Montaury. Dessa forma, estava condenado a morte, e foi executado no dia 03 de março de 1795 por um grupo de 30 indivíduos que invadiram sua casa com machados e o feriram a tiros e com espadas.
O juiz correu lavado de sangue, abraçou-se com o cruzeiro de cedro da Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres, suplicando aos gritos que lhe permitissem confessar-se com o vigário, que impotente e estarrecido, assistia ao bárbaro crime. Mas os matadores não lhe atenderam e lhe deram facadas no estômago e no pulmão, quase decepando a cabeça com uma foice. Seu afilhado, João do Nascimento, tentou defende-lo e foi morto. Manuel Carlos de Melo e Antônio da Silva Bezerra, que tentaram socorrer João, saíram feridos.
Era então governador da capitania do Ceará, Luiz da Mota Feo e Torres, que indignado com o crime, mandou fazer rigorosa investigação, a qual o ouvidor José Vitorino da Silveira terminou em 1796, quando concluiu que os mandantes haviam sido o Cel. Manuel Martins Chaves e seu sobrinho, o Capitão-Mor Bernardino Gomes Franco, e os mandatários: Felipe Néri, antigo inimigo do juiz, seus filhos Sebastião e Manuel, seus sobrinhos Vitor e Raimundo, os capangas Teodósio, João Pereira, Manoel Ferreira, o abade João Fernandes, Felipe Marçal e seu irmão Antônio, João Martins, João de Araújo, José Dias, Francisco Ribeiro, Luís Antônio, Domingos Ferreira, o crioulo Simeão e o africano Pedro.
O governo se empenhou em prender Martins Chaves e seus principais colaboradores, causadores de uma grande onda de violência na capitania. Nenhum efeito teve o empenho de todas as autoridades para prendê-lo, até que durante o governo de João Carlos Augusto Ulrico de Oyenhausen e Grevenburg, o Marquês de Aracati (1803/1807), finalmente conseguiram prender o terrível coronel.
O Governador João Carlos recebeu ordens secretas de Portugal para prender o Feitosa (Manuel Martins Chaves). Decidido a efetuar a prisão, João Carlos anunciou uma revista geral dos regimentos da capitania. Feita a revista das tropas de Vila Nova Del Rei, Martins Chaves e mais alguns membros a mais alguns membros importantes da Vila, quiseram ser gentil com o governador e decidiram acompanha-lo até certa altura do trajeto de volta.
De passagem pelo rio barriga, seu proprietário, um padre, insinuou que deviam se esconder, pois desconfiava das intenções do governador. Bernardino Franco aceitou o conselho e desapareceu, mas Martins Chaves e o sobrinho Francisco Xavier decidiram seguir com a comitiva até Ibiapina, onde o governador dispunha dos meios para executar seu plano e prendê-lo.
Lá se encontravam Manuel da Silva Sampaio com 400 dirigentes dos índios de Viçosa, índios flecheiros e um barracão, onde o governador descansaria. Entrando no barracão, João Carlos retirou de dentro de uma das malas uma coroa real, colocou-a sobre a mesa e dirigindo-se a Martins Chaves perguntou se conhecia de quem era aquela coroa, que respondeu ser de sua majestade, então, João Carlos disse-lhe: “Pois em nome dela se considere preso!” Martins Chaves tirou a espada da cinta e entregou-se. Francisco Xavier, vendo aquela cena, chamou João Carlos para um particular, convite ao qual o governador se negou e mandou que ele seguisse o exemplo do tio.
Esse relato, contado pelo Barão de Studart, que acredita, haverem acontecido as prisões em novembro ou dezembro de 1805, diverge da versão contada por Henry Koster quando esteve no Brasil em 1810, versão essa, copiada por Roberto Southey em seu livro “History of Brasil”, quando contam haver o governador pego Martins Chaves e seus familiares, durante a noite, dentro de sua própria casa, enquanto dormiam e onde foi o governador recebido como hóspede, o que, discorda o Barão de Studart, pois o bom caráter de João Carlos, não permitiria que agisse de forma traiçoeira e covarde.
Os prisioneiros permaneceram em Fortaleza por 84 dias e em Aracati por oito. Deram entrada no Limoeiro, em Lisboa, no dia 26 de maio de 1806. Na cadeia de Limoeiro, requereram sua liberdade ao príncipe regente, a qual foi negada. Manoel Chaves faleceu na prisão no dia 25 de maio de 1809 e Francisco Xavier voltou ao Brasil, mas se desconhece a data. Sua filha Antônia, casou-se com Antônio Ferreira Sampaio e foram os pais de Antônio Sampaio, o General Sampaio, era sobrinho-neto do Cel. Manuel Martins Chaves.
Fonte: A margem da história do Ceará, Gustavo Barroso, 1962.
Jaqueline Aragão Cordeiro