Em 1865, em Romão, distante 3 quilômetros de Quixadá, morava um vaqueiro chamado José Balthazar, conhecido como “Dedé”. Homem branco, baixo, barbado, falador e visivelmente nervoso. Criatura mesquinha, conhecido por sua excessiva sovinagem, de modo que possuía alguns animais e guardava todo dinheiro que ganhava, deixando a mulher e os filhos a míngua.
Era casado com uma sobrinha chamada “Naninha”, com quem tinha cinco filhos, e costumava bater. Um dia viajou, e sua mulher, que estava prestes a dar a luz ao sexto filho, não tendo um cueiro sequer, vendeu um dos pequenos queijos que produziam, os quais ele deixava sempre contados, e comprou alguns tecidos para fazer as roupinhas do bebê. Ao retornar da viagem, estava no terreiro debulhando feijão com a esposa e filhos, todos menores de 7 anos, quando deu pela falta do tal queijo. Irado, indaga Naninha, que trêmula e nervosa explica o que fez.
Mais furioso ainda, Dedé parte para cima da mulher para espancá-la, esta corre em direção ao alpendre da casa, quando cai de repente, vítima de uma violenta paulada na nuca, que lhe quebrou o crânio, dada pelo marido. Volta-se para os filhos que choravam junto ao corpo da mãe que agonizava, e para que não desconfiassem dele, espanca os filhos, torcendo o pescoço do maior, a quem aleijou e dá uma grande pancada na cabeça do outro, abrindo um grande ferimento, em seguida dá um soco em seu próprio olho, corta-se com uma navalha, ensopando de sangue sua espessa barba, e, finalmente, arromba a fechadura da mala onde guardava moedas de ouro e prata e a joga no curral das vacas, deixando algumas moedas caídas no chão. Volta-se aos filhos e ameaça-os de morte caso contem o acontecido.
Na manhã seguinte, indo Antonio de Macedo buscar uma cangalha na casa de Dedé, depara-se com o cadáver de Naninha, então volta correndo ao povoado para contar o acontecido. Foram todos para o sítio ver a tragédia. Chegando lá, o delegado acompanhado por grande multidão, encontram o assassino enrolado numa rede e gemendo, se fingindo de doente e perguntando por sua “mulherzinha” e pela mala que lhe haviam roubado, querendo assim, atribuir o crime a terceiros. A mala e seu conteúdo foram logo encontrados. Ao ser interrogado, acusou Antonio de Macedo e João Marianno, seus vizinhos e inimigos, declarou ele. Por ordem do delegado, Dedé e os filhos foram levados em redes para o povoado.
Na mesma noite do crime, Dedé contou e sua irmã e sogra o que realmente aconteceu, e esta, desprovida de sentimentos maternos, ao invés de revoltar-se com o assassino de sua filha, torna-se sua cúmplice, não se separando mais dos netos, que feridos e apavorados, ainda foram ameaçados pela desnaturada avó, que fazia insinuações quanto a ameaça que o pai os fizera.
Presos os dois homens acusados por Dedé, seguiam algemados para Quixeramobim quando encontra-se a escolta com o Juiz daquela comarca, Dr. Antonio Pinto de Mendonça acompanhado por seu escrivão, Francisco Antonio de Castro e Silva, conhecido como “Castro Poeira”. Tomando o Juiz ciência do fato, fez a comitiva voltar com os supostos homicidas para Quixadá, foi ao local do crime fazer investigações e sem perda de tempo, mandou que separassem as crianças do pai, pois este os mantinha em constante vigilância, para que em sua inocência, não relatassem o que realmente aconteceu.
Os menores foram mantidos em outra casa, aos cuidados do Juiz e do escrivão. Trataram logo em dar-lhes carinho, mimos, contar-lhes estórias a fim de amansá-los, pois eram sempre arredios e não falavam uma palavra sequer. Com o passar dos dias, ao serem indagados, respondiam somente: “Sei de nada não”, por medo do pai que ameaçara matá-los. Por essa ocasião, passava um cadáver para o cemitério, o astuto Castro Poeira, que já havia conquistado a confiança e estima das crianças, teve a sábia ideia de dizer que aquele enterro era do pai deles, que doente, não conseguiu sobreviver. Desse modo, livres do pavor que o pai lhes causava, contaram ao escrivão toda a história do bárbaro crime, bem como, o que fizera a não menos monstruosa avó.
De imediato, foram soltos os acusados inocentes e Dedé foi condenado a prisão perpétua e conduzido e Ilha de Fenando de Noronha, onde provavelmente deve ter falecido, pois nada mais se ouviu falar sobre ele.
Fonte: Revista do Instituto de Ceará – Crimes célebres do Ceará
Jaqueline Aragão Cordeiro