“Relação do Maranhão”- Breve Resumo – Parte 1

Relação do Maranhão é o nome do relato do jesuíta padre Luiz Figueira onde narra sua passagem pelo Ceará, de 1607 a 1608, juntamente com o padre Francisco Pinto com a missão de catequizarem os índios Tapuias, inimigos dos portugueses e aliados dos franceses.

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O padre Francisco Pinto e o padre Luiz Figueira partiram de Pernambuco para o Ceará, com a missão de chegarem até o Maranhão, em janeiro de 1607, na companhia de 60 índios catequizados e foram por mar até o rio Jaguaribe  Ao iniciarem a caminhada pela mata, alguns nativos da missão se embrenharam procurando por parentes, vindo a encontrar alguns escondidos, fugindo dos portugueses com medo de serem escravizados  Saiu um da missão com os recém encontrados na busca por outros mais que continuavam escondidos, prometendo que voltariam no dia seguinte.

Ao amanhecer os padres mandaram mais uns 3 ou 4 índios com farinha e refresco, ao encontro do primeiro grupo, para auxiliá-los. Voltaram pela madrugada trazendo consigo 4 homens e uma menina, contaram que os novos agregados, naquele mesmo dia, haviam sido atacados pelos “Tapuias”, que mataram alguns e levaram outros como escravos. Ao verem o restante do grupo se alegraram por não serem portugueses que os escravizariam e por encontrarem ali tantos parentes.

No dia 2 de fevereiro partiram rumo a serra da Ibiapaba logo após celebrarem a missa e darem a comunhão  A frente iam os índios naturais da região, na esperança de encontrarem mais parentes “Jaguaribaras” escondidos. Certo dia, se depararam com um que os observava de longe, para saber ao certo quem eram. Vindo com um da caravana, contou-os que haviam mais homens, mulheres e crianças, os quais logo vieram se juntar ao grupo. Contaram então, que seus filhos, irmãos e primos foram capturados e levados como escravos para a Bahia, por isso, não confiavam em ninguém.

Em 2 de março chegaram a uma bela enseada onde encontraram uma pequena tribo de fugitivos com 50 ou 60 pessoas, sob o comando do chefe “Acajui”, sobrinho de um membro da expedição. Nesse dia haviam caminhado 5 léguas sem descanso por causa da forte chuva que caiu. Atravessaram quatro riachos com água na altura do peito, em um deles foi necessário fazer uma corrente humana para conseguirem atravessar, tão forte era a correnteza. Foram recebidos com enorme alegria, já havia inclusive,  uma choupana de palha feita para descansarem, pois já sabiam que o grupo se aproximava. Acenderam uma fogueira para os aquecer e os alimentaram com peixe.

Foram necessários alguns dias de repouso, pois alguns adoeceram por ficarem tanto tempo expostos na chuva e também, provisionarem alimento, pois o que trouxeram já estava quase no fim. Maiores dificuldades surgiram ao saírem da região litorânea e entrarem na mata, num local chamado “Serra dos corvos”. Os índios diziam que lá encontrariam muito mel e ratos, que é o melhor alimento encontrado nestes sertões, mas enormes foram as dificuldades, ao contrário das expectativas.

Passaram entre 12 e 13 dias sem saberem quando era dia ou noite por causa da espessa e alta mata, abrindo caminho a ferro, subindo e descendo montes, saltando de pedra em pedra, hora por cima, hora em direção aos abismos. Os alimentos iam faltando, não havia mais sequer vinho para as missas. Muitas foram as pragas encontradas: caranguejeiras, cobras, carrapatos, mosquitos e moscas que deixaram os membros da caravana mais parecidos com leprosos, de tantos ferimentos. Quando finalmente saíram da serra, após 12 ou 13 dias, não haviam andado mais que 2 ou 3 léguas (1 légua = 6.600 mts. No período colonial),  com tantos obstáculos pelo caminho, o percurso que fariam em 15 ou 20 dias, foi feito em 2 meses, mas pior que isso, foi perderem um companheiro índio vítima de picada de cobra, era domingo de ramos.

A travessia do rio chamado “Aracategi” foi o mais difícil, fizeram uma jangada que quase não suportou tanta chuva carregada de trovões e relâmpagos. Depois de saírem da Serra do corvo, caminharam pelos campos onde não davam um passo sequer, sem atolar na lama. Foi necessário ficarem descalços, mas logo seus pés estavam feridos. Padre Luiz Figueira foi quem ficou em pior estado, criando inclusive, larvas em seus ferimentos, a necessidade os fez se calçarem novamente.

Logo ficaram sem alimento, comendo apenas ervas e raízes que fez adoecer alguns. Cobras, lagartos e lagartixas eram banquete para os índios, os padres foram obrigados a se alimentar com tais animais, apesar do asco, pois a fome era maior. Mas tais alimentos não eram suficientes para dar a energia necessária para tão difícil e longa jornada. As cobras eram o maior perigo, uma cascavel havia matado um índio, e Deus os havia livrado de muitos outros incidentes com tal réptil.

Antes de chegarem ao destino, foram recebidos no meio do caminho, por alguns parentes dos índios da caravana, que logo trouxeram refresco e espigas de milho para todos, antes de chegarem a aldeia mais próxima onde seriam recebidos. Após apaziguarem a fome, caminharam mais uma légua e meia e subiram rumo a aldeia chegando por volta de 2 ou 3 horas da tarde. Foram recebidos pelo chefe, com macaxeira cozida e palmito, logo em seguida os abraçou e dizendo “Iesu”, todos também os abraçaram, dando boas vindas. Livres da chuva e sob agasalhos, abrigados em uma cabana feita para eles, logo começaram a receber presentes, que na época eram alimentos. Nessa aldeia passaram 15 dias. Narra ainda o padre Luiz Figueira, que outros que escreveram aos reis e príncipes da Europa, não o fazem com mais satisfação do ele o faz agora contando tais fatos.

Nesta grande serra, há 2 ou 3 anos, haviam mais de 60 aldeias indígenas, após as invasões, guerras e escravidão dos nativos, os índios fugiram para o Maranhão, supondo eles, que os brancos haviam destruído todos os moradores do Jaguaribe. No Maranhão não foi melhor, pois foram mortos pelos franceses ou por doenças contagiosas. Os que restaram no Jaguaribe, ou foram mortos ou escravizados pelos “Tapuias”, de modo que das dezenas de aldeias, sobraram apenas duas, esta, a primeira em que chegaram por estar mais próxima do mar, com uns 20 casais, e a outra deveria ter uns 50 ou 60.

A fome os deixou só pele e osso, então era necessário seguirem para um local mais farto onde pudessem se refazer. Mandaram então, um mensageiro à outra aldeia no intuito de saberem se  poderiam seguir para lá. Como resposta, o chefe chamado “Diabo Grande”, mandou seu irmão chamado “Diabo Ligeiro” juntamente com outros, para que os levassem em segurança até lá e os presentearam com milho e feijão. Com a promessa feita pelos padres de que seguiriam Diabo Ligeiro, este mandou os demais retornarem e comunicar ao irmão o dia da chegada da caravana. Seguiu também com eles, toda a aldeia a fim de fugirem da fome. Gastaram 11 dias nessa caminhada.

Para chegarem a segunda aldeia era necessário descer a serra e subir novamente, missão quase impossível por causa da fraqueza com que se encontravam. Ao chegarem no pé da ladeira, deitaram em umas pedras sem mais condições de andarem sequer até o local onde passariam a noite. Então, avistam 2 índios que se aproximavam trazendo um pouco de farinha de milho, esse alimento mais pareceu trazido do céu por anjos, assim, puderam chegar aos “tujupares” que eram as choupanas onde pernoitariam e os outros já estavam. Lá também se encontravam outros com o irmão mais novo de Diabo Grande, que traziam farinha, peixe, milho e abóboras além da orientação de levá-los em redes, não só na subida da serra, mas todas as 5 léguas até a aldeia, o que fizeram prontamente. Faltando apenas uma légua, foi ao encontro deles a esposa do chefe levando mais presentes.

No dia seguinte, a meia légua do destino, veio encontrar-lhes o próprio Diabo Grande, outros chefes e algumas mulheres com mais presentes e instrumentos musicais fazendo tamanha festa que os surpreendeu. Chegando na aldeia os levaram até a casa que lhes tinham preparado, trouxeram mais presentes e a comemoração durou 2 dias. A comida ali também era pouco por causa da seca do ano anterior (1605/1606).

Fonte: Revista do instituto do Ceará
Jaqueline Aragão Cordeiro

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