O Garoto

“O Garoto” foi um tabloide de sátira e humor crítico lançado em Fortaleza, a 3 de novembro de 1907. Seu subtítulo peculiar dava o tom do estilo editorial: “Critico, desopilante, molieresco, rabelaiseano”. O título vinha sempre acompanhado da imagem de uma mascote, um garoto de camisa listrada, chapéu e ares travessos, situado na paisagem fortalezense. A impressão era feita em tipografia própria.

O Garoto apresentava-se jocosamente como jornal que “publica-se indeterminadamente”, não aceitando “collaboração de pessoa alguma nem assignaturas, ouviu?”. Cada exemplar custava 100 réis e a correspondência dos leitores deveria ser remetidas ao nº 236 da rua 24 de Maio. Seu primeiro editorial ressaltava:

O Garoto surgindo hoje na area jornalistica, vem prehencher uma lacuna (…). Atravessamos uma epoca de marasmo, de falta de estimulo mesmo, preguiçando p’r’ahi numa especie de spleeun maldito que nos vai atrophiando aos poucos e haurindo gota a gota o nosso alento vital. (…) O Garoto então, sacudindo os guizos da Troça, da Pilheria e da verdadeira Gargalhada, – jogral eterno, espera fazer uma transformação completa. O seu lemma é fazer rir até morrer… mesmo a qualquer um hipocondriaco que haja porventura, algures, com cara d’asno. Nada de tristezas, portanto. É folgar rijo, que a vida é breve e a morte certa.

Por vezes agudo nas ironias, em suas quatro páginas O Garoto publicava crônicas humorísticas diversas e causos populares, comentários mordazes sobre a sociedade fortalezense, irreverentes “Notas Avulsas”, versos satíricos, uma seção intitulada “Parte da Polícia” (assinada pelo “Dr, chefe de Polícia Secreta” João Cotôco, que sempre encerrava suas cartas ao jornal desejando-lhe “doença e inimizade”), troças em forma de pensamentos de “Manoelzinho do Bispo”, fictícios telegramas humorísticos, pequenas ilustrações, entre outros textos irreverentes e cômicos. As capas e as últimas páginas das edições do tabloide quase sempre traziam charges.

Com espírito anti-burguês, a edição nº 2 d’O Garoto, de 15 de novembro de 1907, apresentava na última página uma charge denunciando o triste destino de caixeiros no Ceará, em face de seus “patrões botocudos!”. Na capa da edição seguinte, comentava-se a opinião de um típico burguês frente ao aparecimento do jornal: “Impassivel como um coveiro, estupidamente bestial e desdenhoso como sempre! Ah, bentosaurio ante-diluviano! Deus permitta que morras d’uma indigestão…”. Em edições seguintes, as charges de última página passaram a satirizar figuras conhecidas de Fortaleza, sobretudo homens de letras.

Nunca informando os nomes de seus editores (que não deviam ser desconhecidos dos leitores), no nº 6, de 26 de janeiro de 1908, o jornal, sempre em tom irreverente,“desafiava”: “O Garoto continua firme no seu posto de honra, rindo dos imbecis e desdenhando dos cobardes. Quem se julgar ofendido e desejar tomar satisfação, sele-se e venha; os redactores são bem conhecidos e escusado é dizer que assumem a responsabilidade”. No número seguinte, de 9 de fevereiro de 1908, O Garotoexplorou uma polêmica criada em torno do intelectual local Antônio Pinto Areal Souto, que já havia sido ironizado em edição anterior: ali, Souto era considerado figura de “uma mediocridade bafejada por elogios encommendados e lisonjas pagas de indivíduos sem cotação”. Mais tarde, em sua edição de primeiro aniversário, o jornal revelaria ter outros desafetos.

A periodicidade d’O Garoto era irregular. Da edição inicial até o nº 4 do ano 1, de 22 de dezembro de 1907, o jornal foi, quase sempre, quinzenal. Lançando seu nº 5 em 5 de janeiro de 1908, o nº 6 só veio a público no dia 28 do mesmo mês. O nº 7 não tardou a aparecer, em 9 de fevereiro, mas o nº 8 foi publicado somente em 22 de março. A partir deste momento, O Garoto saiu com periodicidade mensal, com edições lançadas aproximadamente no dia 18 de cada mês. Essa regularidade, no entanto, durou apenas até o nº 11, de 18 de julho de 1908. O nº 12 do ano 1 só veio a aparecer em 8 de outubro daquele ano. Após a edição deste número, O Garoto lançou edição comemorativa de seu primeiro aniversário, em 3 de novembro de 1908 – na ocasião, com numeração reiniciada, saindo, portanto, como seu nº 1 do ano 2. Depois desta edição, presume-se que o tabloide tenha publicado somente mais uma, o nº 2 do ano 2, de 12 de dezembro de 1908.

Na edição de primeiro aniversário, de 3 de novembro de 1908, O Garoto publicou com destaque o soneto “Anniversario d’O Garoto”, escrito por Olavo Bilac especialmente para a ocasião e enviado por telégrafo a Fortaleza.

Fonte: Biblioteca Nacional Digital
Jaqueline Aragão Cordeiro

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